Frei João Costa, OCD
1. Celebramos hoje a festa da Santíssima Trindade. Celebramo-la com gratidão e com amor; afinal, tudo o que temos e somos devemo-lo à força amorosa do nosso Deus-comunhão, Pai, Filho e Espírito Santo. Celebremos hoje o nosso Deus Trindade Santa, lembrando que esta festa resume toda a história e toda a nossa fé: Deus é Deus que cria, salva e santifica; é Deus que cria a vida, nos salva de todos os nossos erros e traições, nos atrai para Si e, santificando-nos, nos torna belos, mais e mais afeiçoados a Ele. Celebremos esta festa e que o nosso coração exulte como um dia exultou o do Salmista quando cantou: «Senhor, tu me sondas e me conheces, de longe penetras o meu pensamento. A palavra ainda não me chegou à língua e já a conheces inteira, tu me envolves por trás e pela frente, e sobre mim colocas tua mão. Se subo aos céus tu lá estás, se desço às profundezas da terra, aí te encontro».
2. Deus é Deus; e é uma alegria e um encanto que O possamos louvar e adorar; que Lhe possamos cantar e encantar o coração; que O possamos incensar com os mais belos perfumes e O bendizer! Nem palavras nem beijos Lhe aumentam o ser, mas é óbvio que afagar o coração de alguém diminui-lhe as pulsações e o risco de enfarte.
Ah! Como é belo o nosso Deus! E como quão pouco sabemos de Quem tanto nos ama e de nós tudo sabe!
3. Há um jornal diário que muda de nome todos os dias – é uma técnica de marketing, certamente! Como se chama I, uns dias diz-se Inimitável, outros, Interessante, além, Incomum, e por aí adiante.
Lembrei-me desta estratégia, quando na oração, me pus a considerar sobre Deus, e depois, lendo livros de teologia, vi que eles me diziam que, comparando Deus a nós, areiazitas, Ele é Altíssimo, Incompreensível, Imenso, Incomensurável, Inabarcável, Infinito, Indizível, Imutável, Ilimitado, Imortal e muitos muitos mais is! Enfim, tantos is é o nosso Deus!
Sim, para este domingo da Santíssima Trindade senti-me tentado a contar os is com os quais, na nossa vida de oração e de relação com Ele, nos atrevemos a dizê-Lo. Felizmente desisti, pois logo vi que mesmo gastando todas os is ainda restaria na margem impossível de descrever a Sua totalidade.
4. Ora, por hoje, eu fico-me por aqui. Aceito humildemente a minha pequenez de areiazita que me revela ser impossível descrever o meu Deus; e aceito que talvez seja melhor nem ir por aí, nem me esforçar por descrevê-Lo. Não, eu não vou encarcerar o meu Deus nem numa palavra, nem num milhão delas. Eu vou ficar-me por aqui e vou adorá-Lo; vou ficar por aqui e vou amá-Lo; vou ficar por aqui e vou imitá-Lo; vou ficar aqui a servi-Lo. Isso me basta!
Mas descrevê-Lo ou defini-Lo, não. Isso não farei! Eu assumo que sei pouco de Deus, que Nele mergulho e perco o fôlego, pelo que logo tenho de vir à tona respirar, quando, talvez, me deveria entregar ao Seu terno abraço sem medo, sem considerações, sem palavras nem pensamentos – apenas entregar-me.
Mesmo querendo, eu vou resistir a querer vê-Lo, hoje ou amanhã, porque já estou Nele! Cerebral eu seja, mas recusarei classificá-Lo, clarificá-Lo, defini-Lo, encerrá-Lo… Pequenino eu seja, que só a Ele me entrego. Não me importarei que Ele seja grande e eu não consiga abraçá-Lo como abraço a minha mãe! Porque me haveria de importar por não saber defini-Lo, se Ele me abençoa e o Seu sopro logo brinca com os poucos cabelos que ainda tenho?
Eu quero apenas mergulhar Nele, refrescar-me Nele, saciar-me Dele, quedar-me Nele como quem fica consolado num ninho ou ao colo da mãe – mas a mãe cantarolando-nos e embalando-nos, claro. Eu querer-me-ei assim; e se for só assim, isso é tudo e me basta. Não Lhe pedirei explicações sobre as origens do mundo, como nascemos ou como nasceu a criação, se foi do barro húmido que Ele trabalhou e sobre o qual depois soprou, ou se houve evolução. Não Lhe perguntarei sobre a maldade da humanidade, nem sobre guerras entre irmãos que, obviamente Ele não quer, não promove, nem aceita. Não Lhe perguntarei nada, nem sequer para onde vamos ou por onde vamos, porque já sei que vamos para Ele, para casa – essa casa onde há muitas moradas para todos nós.
5. Não, nem sequer falarei com Ele sobre matemática. Não; o que eu quero é um ninho, um colo. Nesse colo que já é meu, eu não precisarei nem de conversar nem que Ele me ralhe!
Eu sei que Ele tem esse colo reservado para mim! E sei que não andarei jamais à bulha com alguém, disputando o colo só para mim, que o colo Dele dá para todos nós, para mim e para ti, qualquer que seja o feitio do teu nariz – do meu nada digo porque é bonito; é isso que todos pensamos, não é? Quero apenas esse colo mesmo que, à partida, eu saiba que posso não merecê-lo. Tenho, porém, a intuição de que Jesus já o ganhou para mim! Para ti. E tenho a certeza de que todos lá caberemos – mesmo os que aqui na terra jamais conseguimos sentar-nos juntos à mesma mesa! Não falarei com Ele de matemática, dizia. Não O interrogarei como é que Ele, o Deus único e verdadeiro é Três. Não quero equação nem explicação, quero o colo de Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo!
6. É fácil, por agora, pôr as coisas assim mas, a verdade é que não vejo como considerá-las de outra maneira. Que me interessa que a inteligência não compreenda que Um é Três, se o que importa é saber que dele venho, com Ele caminho e para Ele vou, pois Nele só arde o desejo de receber-me em Seu regaço! Um colo assim, é tudo quanto preciso, porque eu já vi que a muitos lhes ardeu a cabeça de tanto pensarem, de tanto escreverem sobre a Santíssima Trindade, e depois de tudo, quando, finalmente, chegaram ao Colo de Deus a primeira coisa que fizeram foi mandar queimar tudo quanto haviam escrito na terra!
7. Hoje é dia do meu Deus Eterno que sabe a trigo e a vinho e ao restolho onde pascem os rebanhos, que sabe a maresia, dormiu numa barca e aspirou os perfumes dos vinhedos. Um Deus humano e real, enfim. Próximo, amigo e Pai preocupado connosco – como mãe com o seu filhinho pequenino.
8. Eu só amo um Deus inexplicado, sim, mas cujo coração late por mim.