Frei Francisco Maria Braguês, OCD
O ser humano é mistério. Aproximarmo-nos de uma figura maior é sempre uma ousada ousadia. Cada pessoa tem sempre uma história para contar. E que terá a dizer-nos uma jovem francesa que viveu apenas 24 anos? Atrevamo-nos, pois, a acercarmo-nos à vida de Teresa do Menino Jesus.
Maria Francisca Teresa Martin Guérin nasceu em Alençon, França, a 2 de janeiro de 1873. Foi a última dos nove filhos de Luís Martin e de Zélia Guerin, canonizados no dia 18 de outubro de 2015 pelo Papa Francisco. Dos nove filhos sobreviveram cinco meninas: Maria, Paulina, Leónia, Celina e Teresa. Todas entraram na vida religiosa.
Os primeiros anos de vida de Teresinha foram muito felizes. Tal felicidade foi quebrada pela morte da mãe em 1877, vítima de um cancro, quando tinha quatro anos. A morte prematura da mãe afetou profundamente a personalidade da jovem. Apesar da ternura que recebia da sua família, em especial do pai e das irmãs, a até ali cheia de vida tornou-se menina tímida, muito calada e tremendamente sensível.
Após a morte de Zélia, os Martin mudaram-se para os Buissonnets, em Lisieux. Teresinha confessará que nesta casa foi verdadeiramente feliz, recordando-a sempre, carinhosamente, como o «doce ninho de infância».
Em 1882, Paulina, a irmã mais velha, que Teresinha tomara por mãe, entrou no Carmelo de Lisieux. A decisão provocou-lhe um duro sentimento de perda. Assaltada por uma doença estranha, curar-se-ia, pelo sorriso de uma imagem da Virgem Maria!
Entre as suas muitas ternas recordações está a do dia da sua Primeira Comunhão. Compreende-se: no século XIX, comungar não era como hoje. Tratava-se de uma conquista que não era alcançada por todos, devido ao moralismo escrupuloso que marcava a época.
No Natal de 1886, dois meses depois da entrada no mesmo Carmelo de Lisieux da sua irmã Maria, Teresa recebeu a graça especial da sua conversão: nessa noite, ultrapassou a hipersensibilidade que a marcava há tantos anos.
Havia muito que a filha mais nova de Zélia e Luís Martin desejava entrar, também ela, no Carmelo. Após receber a autorização paterna, em 1887, devido à sua parca idade, pediu em Roma, a Leão XIII, uma autorização especial para poder ingressar no claustro carmelita. E foi assim que, em 1888, a jovem consumou o seu desejo: entrar no Carmelo de Lisieux, onde professa com o nome religioso de Teresa do Menino Jesus. Mais tarde acrescentaria «e da Santa Face», aquando da doença psiquiátrica que tanto fez sofrer o seu pai.
Dentro do Carmelo, foi formadora das jovens religiosas. Além disso, correspondeu-se com dois missionários, criando uma relação profunda de amizade e de acompanhamento espiritual. Teresa sentia dentro de si ardentes desejos missionários, e rezava muito por todos aqueles que saíam para os lugares mais inóspitos para anunciar o Evangelho. E assim, desde dentro da clausura, a jovem carmelita tornou-se uma missionária pela sua vida de oração. Foi, por isso, declarada pela Igreja Padroeira das Missões juntamente com São Francisco Xavier.
A 30 de setembro de 1897, com apenas 24 anos de idade, morreu vítima de tuberculose. Foi beatificada a 29 de abril de 1923 e canonizada no dia 17 de maio de 1925 pelo Papa Pio XI. A 19 de outubro de 1997 foi proclamada Doutora da Igreja por São João Paulo II. A Igreja e todo o mundo recordam-na de forma especial no dia 1 de outubro.
Dela conservamos vários escritos autobiográficos, publicados e difundidos logo após a sua morte com o nome História de uma Alma. Traduzidos em variadas línguas e espalhados por todo o mundo, os escritos da jovem carmelita francesa são, ainda hoje, largamente lidos e conhecidos.
A sua grande descoberta foi a do rosto misericordioso de Deus, em contraste com o que naquele final de século a Igreja apregoava: um Deus justiceiro e condenador. Em sua oração, Teresa, a pequena, descobriu que Deus é misericórdia, e a nossa relação com Ele há de ser como a de pai e filho. E assim, a alegria – e não o medo – deve marcar a nossa vida. Mereceu, em consequência ser reconhecida como doutora da ciência do amor, pela revolução espiritual que propôs à sua época.
A sua vida foi um louvor e um oferecimento ao amor misericordioso de Deus, por isso proponho a escuta de Ma joie de Sylvie Buisset:
https://www.youtube.com/watch?v=by0kr6oQ0rc.
* Publicado no Diário do Minho de 2 fevereiro 2023